ILUMINANDO PAISAGENS

Marina Vilela

A intervenção pretende “acender” paisagens de duas cidades da Rota da Seda: Aksu, na China, e Gwadar, no Paquistão.
Aksu, localizada na província autônoma de Xinjiang, na China, foi um importante ponto de conexão entre a China e a Ásia Central na Rota da Seda. Trata-se de uma das regiões chinesas com maior presença islâmica da China, característica perceptível nas cidades e construções até hoje.
Gwadar, cidade na província do Baluchistão no litoral do Paquistão, encontra-se no eixo geoestratégico do corredor econômico China-Paquistão, e abriga um dos mais importantes portos da região, o Porto de Gwadar. Esse corredor econômico, para a China, serve como principal rota de acesso para o Oceano Índico, Golfo Pérsico e Mar Arábico, diminuindo a dependência de Pequim da utilização do Mar do Sul, e constituindo um novo braço marítimo para a Rota da Seda. A presença chinesa em Gwadar é forte e materialmente visível na cidade, que já possuí até um master-plano para construção da Gwadar smart port city a partir de incentivos chineses.
As duas cidades, apesar estarem localizadas em contextos completamente distintos e apresentarem diferenças marcantes, se assemelham na diversidade de paisagens que possuem, passando por cidades com grandes infraestruturas; arquiteturas antigas e históricas; até desertos e regiões montanhosas pouco habitadas. Além disso, é interessante perceber as diferentes influências que grupos étnicos trazem para as paisagens, o que atesta a grande diversidade cultural que aquela região – tradicionalmente uma rota internacional – possui até hoje.
Por meio de contraposições de ilustrações, feitas no formato das clássicas luminárias chinesas, pretende-se representar essas diferentes paisagens que compõem as cidades: seja a arquitetura tradicional ou religiosa; o urbanismo tecnológico e planejado; ou as paisagens não construídas – montanhas e desertos. Por vezes, essas características se mesclam em um mesmo lugar, resultando em paisagens complexas e impressionantes.

 Marina Vilela

O PROCESSO

As lanternas fazem parte do imaginário chinês há muito tempo, utilizadas nas comemorações do ano novo chinês. Nos quinze dias em que o Ano Novo é comemorado, penduram-se lanternas vermelhas acesas na porta principal das casas. Ao final das festas, acontece o Yuan Xiao ou Festival das Lanternas, criado há cerca de 2.000 anos pelo Imperador Han Mingdi. Além de um momento de socialização, o Festival das Lanternas é, historicamente, um momento de liberdade, pois era a única noite em que as mulheres chinesas, na China Antiga, eram permitidas de sair de casa, passear livremente, acender lanternas, brincar e interagir. É a partir desse símbolo que foi estruturada essa intervenção, feita com luminárias de papel.

O processo de produção das luminárias de papel foi 100% artesanal e colaborativo e, por isso, em meio ao texto serão inseridos os agradecimentos para as pessoas que me ajudaram nesse processo. Após feito os croquis, o desafio iniciou-se na definição da materialidade do objeto, que precisava ser uma estrutura leve o suficiente para ser pendurada, mas rígida o suficiente para ser capaz de sustentar o peso dos circuitos elétricos e não tensionar o papel a ponto de rasgá-lo.

Para as bases circulares das luminárias, após algumas tentativas de fazê-las com fios de aço, encontrei, em uma casa de aviamentos, bastidores de madeira de costura, utilizado por bordadeiras. A indicação desse material veio da minha amiga, arquiteta e colega de trabalho Anna Lobato, a quem vai o meu primeiro agradecimento. Para o “perfil I” estrutural da luminária, utilizei palitos de algodão doce, também de madeira.

Após a definição desses materiais, me deparei com um segundo desafio, prático, de como fazer as conexões – juntas estruturais – entre os materiais. Nesse momento, agradeço a outra amiga e arquiteta, Amanda Castilho, que me emprestou solda, ferro de solda e fio de aço galvanizado, por tempo inicialmente indeterminado, facilitando o processo de prototipação dessas conexões estruturais. Por fim, os fios de aço galvanizados, enrolados com alicate nos palitos de algodão doce, possibilitaram as juntas soldadas das peças de madeira da “viga I”. Para a fixação desta viga nos bastidores de costura, encaixes feitos furando a madeira com o ferro de solda solucionaram o problema.

Para a iluminação das luminárias, construí um circuito elétrico utilizando 3 baterias de lítio de 3 volts para cada luminária, para que a intervenção não ficasse dependente de tomadas. Duas pequenas fitas de 3 leds 3000K cada compõem o circuito de cada luminária, finalizando com um interruptor externo para ligar e desligar. O circuito foi soldado e fixado na “alma” do “perfil I” interno da luminária. Envolvendo o circuito, um papel de seda funciona como difusor, fixado com acabamento em papel cartão pardo.

Inicialmente, a luz seria branco-quente, mas durante o processo, por sugestão da Natacha Rena, decidi fazê-la vermelha, substituindo o papel de seda interno, anteriormente branco, por um vermelho.

Por todo o processo de construção, agradeço imensamente a ajuda da minha arquiteta preferida, Carolina Almeida, que passou dois finais de semana inteiros construindo luminárias comigo.

Por fim, para as ilustrações escolhi quatro imagens – duas de Aksu, duas de Gwadar – que representassem as contraposições de paisagens desses territórios e as influências étnicas externas às quais esses territórios estão submetidos. As ilustrações foram feitas com uma mesa digitalizadora emprestada por mais um grande amigo, o designer Pedro Assis, impressas em papel vegetal e coladas na parte interna dos bastidores, com ajuda de mais um amigo arquiteto, Ricardo Lobato.